#31 – Rupturas, recessos e celebrações
Ruptura
Tem horas que é matar ou morrer. É surtar ou morrer. É jogar tudo pro alto ou morrer. É arrombar as premissas do adequado ou morrer. É rasgar a ordem ou morrer. É largar tudo ou morrer. É pegar o primeiro ônibus pro primeiro lugar sem saber o amanhã ou morrer. É implodir o que era esperado ou morrer. É se colocar no limite do risco ou morrer. É olhar a morte no olho ou morrer. É pegar a vida pelo pescoço ou morrer. É morder a vida no olho ou morrer. Tem horas que é morrer ou morrer.
Recessos e celebrações
Hoje não ia ter newsletter, mas achei esse textinho perdido nas lembranças do Facebook (diretamente de 2015) e resolvi enviar. Até mesmo porque vou fazer um pequeno recesso pra recarregar as energias, então nas próximas 2 semanas não teremos edições novas. Volto no dia 5 de fevereiro. Enquanto isso, se você gosta do que eu escrevo e quer receber alguns contos esquisitinhos, você pode se inscrever pra receber a . É uma newsletter com prazo de término definido: serão 7 contos, e o primeiro sai essa semana.
Também aproveito esse e-mail pra comemorar a chegada dos 1000 inscritos! Parece que foi ontem que comecei essa newsletter, despretensiosamente, sem saber se seria mais um dos muitos projetos que eu começo e não consigo levar adiante. Mas vingou. Vingou e estamos aqui, 30 edições depois. Muito obrigada pela leitura e pela companhia. Se você chegou há pouco tempo, pode ler os textos antigos acessando o arquivo.
Fome
Mas o que ela não comia eu passei a comer em dobro. A princípio, como uma espécie de vingança. Comer tudo o que Cecília não podia comer deixava as comidas mais gostosas, principalmente quando ela estava por perto e podia assistir. Aí então é que eu largava os talheres e pegava a comida com as duas mãos, dando mordidas imensas com minha mandíbula de bicho, deixando que os farelos se espalhassem pela mesa. Cecília não dizia nada. Me encarava com os olhos esbugalhados, às vezes disfarçando uma expressão de nojo, às vezes mantendo o rosto impassível.
Depois, a vontade de comer virou outra coisa. Não era só por Cecília. Era também porque eu gostava da sensação de triturar com os dentes pedaços grandes e duros, gostava de mastigar com força, quebrar ossos. Nesse momento, me sentia outra vez um touro, com o corpo cada vez mais pesado, firme, denso, o corpo de um animal difícil de ser derrubado. O corpo de um animal capaz de resistir a qualquer embate.
Esse conto, escrito lá pelo começo de 2022, saiu na revista Toró essa semana. É só clicar aqui pra ler na íntegra.
![](https://substackcdn.com/image/fetch/w_1456,c_limit,f_auto,q_auto:good,fl_progressive:steep/https%3A%2F%2Fsubstack-post-media.s3.amazonaws.com%2Fpublic%2Fimages%2Fa1b6d866-f25c-4c67-a65a-b28f359449eb_750x739.jpeg)
Li, assisti, encontrei
✷ Vi Everything everywhere all at once (ou: Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo) e por pouco não escrevo um textão sobre as nossas versões do multiverso nessa edição de hoje. Mas a verdade é que essa versão minha acabou ficando cansada só de pensar em todas as outras versões minhas que estão por aí, em outros universos, talvez concretizando coisas que eu não consegui concretizar por aqui, talvez tendo mais sucesso em ser o que eu poderia ter sido e não fui. Seja como for, o filme tem aquele humor absurdo e meio niilista à la The good place que eu amo, então gostei demais. Recomendo especialmente pra quem (como eu e Jobu Tupaki) costuma pensar muito na falta de sentido das coisas.
✷ Outra indicação cinematográfica (ando cinéfila), dessa vez pros fãs de horror: Barbarian. Assim que o filme começou, imaginei que ele iria por um caminho, mas acabou indo por outro completamente inesperado. Recomendo assistir sem procurar saber muito antes.
Curiosa com o conto. E adorei esse post do mulheres que escrevem, me identifiquei muito.
Bom recesso!
"Morder a vida no olho" deu até arrepios! Amei ♡♡♡